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Enchentes intensificam conflitos fundiários no norte de MG e colocam comunidades de pescadores em risco

25-02-2022
Fonte: 

Assessoria de Comunicação do CPP

A tentativa de sobreviver às enchentes que muitas famílias de Minas Gerais têm enfrentado, têm sido uma experiência muito mais difícil para as comunidades ribeirinhas do norte do estado, que moram à beira do rio São Francisco. Além das enchentes, os quilombolas pescadores e vazanteiros têm enfrentado a violência dos latifundiários da região. O episódio mais recente aconteceu nessa quarta-feira (23), no município de Januária (MG).

Funcionários da fazenda ameaçaram tirar as comunidades quilombolas de Croatá e de Sangradouro dos seus territórios. As ameaças aconteceram na manhã da quarta-feira (23) nas duas comunidades. Os quilombolas, que ocupam a área tradicionalmente, estão tendo que se deslocar para acampar nas partes mais altas dos seus territórios devido às enchentes do rio São Francisco, o que tem incomodado os fazendeiros locais. 

Na comunidade de Sangradouro, as famílias relatam ameaças de morte, exibição de armas e até agressões físicas contra uma mulher da comunidade que segurava uma bandeira do Movimento dos Pescadores e Pescadoras artesanais (MPP). Um policial reformado, que trabalha para o fazendeiro e empresário Walter Arantes, dono das redes de supermercados mineiros BH, Mineirão e Epa,  ameaçou colocar fogo na bandeira em posse da quilombola e em seguida a empurrou. 

Ainda na quarta-feira, um grupo de 12 agentes de pastorais tentaram entrar na comunidade de Sangradouro para ver a situação, mas foram impedidos por funcionários do fazendeiro que queriam liberar o acesso apenas para 2 pessoas. Na ocasião os policiais disseram que estavam aguardando ordens superiores para ver o que faziam. Depois de um tempo foi permitido que os agentes tivessem acesso às comunidades, mas para isso foi necessária uma série de articulações que envolveram o Ministério Público Estadual, a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o PPDDH (Programa de Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos) e deputados estaduais que de alguma maneira pressionaram a polícia local que já vinha recebendo críticas desde a sua participação no despejo que a comunidade de Croatá havia sofrido no dia 5 de fevereiro, que foi realizado sem  nenhum aparato legal que o justificasse, como por exemplo, a existência de um mandado judicial.

Além do acesso que os agentes tiveram à comunidade de Sangradouro, a comunidade de Croatá também conseguiu acampar na área que estava cercada e que até então estava sendo impedida de acessar. Apesar dessas breves conquistas, quilombolas da comunidade de Sangradouro relatam que durante a madrugada do dia 23 apareceram carros com homens que atiravam para cima e que ameaçavam os comunitários de morte.

Na tentativa de intimidar a comunidade, na manhã de ontem (24), trabalhadores da fazenda que já haviam sido demitidos, foram recontratados e apareceram na área onde a comunidade está acampada, ameaçando colocar cabeças de gado e sal no local. A comunidade não aceitou o sal e após uma longa negociação os funcionários colocaram o sal numa outra área.

Os quilombolas continuam resistindo, temendo que novas ameaças aconteçam e na esperança de que o território seja titulado o mais breve possível para evitar a escalada dos conflitos. As comunidades já têm certidão emitida pela Fundação Cultural Palmares de reconhecimento como comunidade quilombola e aguardam o processo de titulação do território pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) desde o ano de 2018. É importante lembrar que além da ocupação tradicional das comunidades na área, a maior parte do território reivindicado pelos quilombolas, está localizado às margens do rio São Francisco, área considerada da União e que, portanto, não pertenceriam a um particular, como o fazendeiro.

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