Notas, cartas e manifestos

Mais de 145 organizações da pesca artesanal e aliadas lançam nota contra o PL da Devastação

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Instituições da pesca artesanal, entidades ambientais, pastorais, grupos de pesquisa, campanhas, coletivos e movimentos sociais lançam documento exigindo o arquivamento imediato do PL 2159/2021, que ameaça o licenciamento ambiental no Brasil

Mais de 145 organizações da pesca artesanal, entidades de apoio e movimentos sociais de todas as regiões do Brasil tornaram público, nesta sexta-feira (13), um forte posicionamento contra o Projeto de Lei nº 2.159/2021, conhecido como PL da Devastação. A Nota Pública, assinada por colônias de pescadores, associações, coletivos, sindicatos, pastorais sociais, universidades, grupos de pesquisa e mandatos parlamentares, alerta para os riscos que o projeto representa ao meio ambiente, aos povos das águas e ao futuro dos territórios tradicionais pesqueiros.

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O documento foi articulado pelas seguintes organizações: Articulação Nacional das Pescadoras (ANP), a Campanha Mar de Luta, o Coletivo Caiçara, a Comissão Nacional para o  Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiros e Marinhos (CONFREM), o Conselho Pastoral dos Pescadores e das Pescadoras (CPP), Federação dos Manejadores e Manejadoras de Pirarucu de Mamirauá (FEMAPAM), o Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), o Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Litoral do Paraná (MOPEAR). Ele denuncia que o PL, já aprovado no Senado e agora em tramitação na Câmara dos Deputados, desmonta o sistema nacional de licenciamento ambiental, fragiliza a fiscalização, exclui povos e comunidades tradicionais do processo de decisão e pode acelerar a degradação de ecossistemas como mangues, rios, mares e lagoas, essenciais para a pesca artesanal.

“A proposta legislativa permite que empreendimentos como portos, rodovias, exploração de petróleo, mineração, hidrelétricas, parques eólicos offshore e grandes empreendimentos turísticos sejam licenciados sem a devida análise dos impactos ambientais”, afirma a nota.

Entre os principais pontos criticados estão a criação da chamada Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que dispensa avaliação técnica de órgãos ambientais; a possibilidade de descentralizar as regras para estados e municípios, muitas vezes mais vulneráveis às pressões de grandes empresas; e a completa omissão quanto ao direito de Consulta Livre, Prévia e Informada, previsto na Convenção 169 da OIT.

A nota também destaca que, ao contrário do que sugere o discurso de simplificação, o PL serve aos interesses do agronegócio, da mineração, e do setor portuário, permitindo retrocessos socioambientais inaceitáveis em meio à crise climática e à crescente violência contra comunidades tradicionais.

“A proposta legislativa também opera a completa invisibilização de povos e comunidades tradicionais (PCT’s) pois não prevê a realização da consulta prévia, livre e informada, como determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho”, aponta a nota.

Na linha de frente: os povos das águas alertam sobre os impactos do PL

A pescadora artesanal e militante do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), Norma Borges, reforçou a mobilização nacional das comunidades pesqueiras contra o Projeto de Lei 2.159/2021. Segundo ela, os riscos impostos pelo PL vão muito além do meio ambiente, atingindo diretamente a vida, os direitos e a autonomia das comunidades tradicionais. “Nós, pescadores e pescadoras do Brasil, estamos unidos contra o PL da devastação, porque sabemos que, com esse retrocesso e a facilitação dos licenciamentos para os empreendimentos, os territórios estarão correndo sério risco de perder a sua autonomia”, afirmou. Para Norma, o território não é apenas espaço físico, mas parte fundamental da identidade dos povos das águas. “Estão em jogo os direitos já conquistados e o desrespeito aos nossos modos de vida, nossa cultura, nosso ambiente preservado e, acima de tudo, nosso território, que é parte de nossas vidas. Digo não a esse PL da devastação”, declarou.

Para o pescador artesanal Claudio Nunes, integrante do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Litoral do Paraná (MOPEAR), há desigualdade no acesso aos processos de licenciamento no Brasil. Ele destacou que, enquanto empreendimentos que destroem manguezais e ecossistemas conseguem autorização com facilidade, as comunidades tradicionais enfrentam dificuldades até para obter licenças básicas, como para acesso à energia elétrica. “No século XXI, a gente tem aqui 9, 10 comunidades sem energia elétrica, às escuras. Mas licenciamento para construir portos, aeroportos, isso é muito fácil para eles. Licenciamento para destruir manguezais, destruir a base das comunidades, fazer dragagem, isso é muito fácil para eles liberarem”, denunciou. Claudio agradeceu o apoio dos movimentos sociais e reforçou que a luta contra o PL da Devastação é coletiva e necessária: “ninguém larga a mão de ninguém até derrubar esse projeto”, ponderou Nunes. 

O pescador artesanal Lucas Lipe, integrante do Coletivo Caiçara de São Sebastião, Ilhabela e Caraguatatuba, alertou para os impactos diretos que o PL 2.159/2021 pode causar às comunidades tradicionais pesqueiras do litoral norte de São Paulo. Segundo ele, o projeto facilita a especulação imobiliária, um processo comum e violento na região: “A especulação acaba invadindo territórios tradicionais de forma violenta, às vezes silenciosa, e vai ocupando os espaços, grilando terrenos e terras. Então, a liberação e a facilitação de construção, de licenciamento, acaba sendo uma via de acesso à expulsão das comunidades tradicionais dos seus próprios territórios”. 

Lucas também chamou atenção para as chamadas políticas de desenvolvimento que, com o argumento da infraestrutura e transporte de matérias-primas, acabam se sobrepondo aos modos de vida dos povos das águas. Em São Sebastião, ele citou como exemplo o maior terminal aquaviário da América Latina, da Petrobras, e o porto da cidade, que está em vias de ser privatizado e ampliado. Para o pescador, a flexibilização do licenciamento, como prevê o PL, acaba “colocando em risco a facilidade de ampliação do porto sobre manguezais e, não só isso, também os efeitos em outros territórios próximos. Então, é o principal problema relacionado à pesca artesanal e a importância dos mangues para a pesca artesanal mundialmente”, diz Lippi. 

Para Andréa Rocha, secretária de Território e Meio Ambiente do CPP, o PL 2159/2021 aprofunda injustiças já vividas pelas comunidades tradicionais e representa uma grave ameaça socioambiental. Segundo ela, “os conflitos socioambientais ameaçam a manutenção dos ecossistemas, da biodiversidade, do modo de vida dos povos e comunidades tradicionais no Brasil, como as comunidades tradicionais pesqueiras, e também contribuem para o que nós estamos vendo em relação à crise climática”. A secretária afirma que é justamente por isso que o licenciamento ambiental precisa ser fortalecido, e não enfraquecido, como propõe o projeto. “Esse PL representa o agravamento das violações às comunidades tradicionais e também da crise climática que estamos vivenciando”, destaca.

A nota pública assinada pelas organizações da pesca artesanal e seus aliados rompe o silenciamento imposto aos territórios das águas e é um instrumento político importante para a preservação da vida, da biodiversidade e dos ecossistemas. “Que essa nota pública dos movimentos coletivos, organizações da pesca artesanal e de seus aliados e parceiros, possa quebrar o silenciamento imposto às comunidades e contribuir para a preservação dos ecossistemas, da biodiversidade, manutenção da vida no nosso planeta”, finaliza Rocha.

A íntegra da nota pública e a lista completa de signatários estão disponíveis no arquivo em anexo. A expectativa agora é pressionar os(as) deputados(as) federais a barrar esse projeto na Câmara e abrir um debate real, amplo e democrático sobre a legislação ambiental brasileira.

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SERVIÇO

O que: Nota Pública – Organizações da Pesca Artesanal e Entidades Aliadas Repudiam o PL 2159/2021 – O PL da Devastação

- Para entrevistas, mais informações ou falar com representantes das organizações signatárias, entre em contato com a Assessoria de Comunicação do CPP:  comunicacao@cppnacional.org.br

- Todo material da campanha e da nota contra o PL da devastação estão disponível neste link: https://drive.google.com/drive/folders/1glrsAbvuXvQ7cukNRzh_GroayfP09P8i...

* Fotos: 1 - Thomas Bauer | 2 e 3 - Henrique Cavalheiro