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Nota Pública em defesa dos direitos do Povo Tupinambá

13-02-2014

Pesquisadores da Universidade Federal da Bahia (UFBA) lançaram uma nota pública em apoio a situação de grave conflito na Terra indígena Tupinambá de Olivença, Povo Tupinambá | Foto: Racismo Ambientallocalizado em Ilhéus/BA, e se solidarizam com a carta de antropólogos e pesquisadores que atuam junto à essa população, e que denuncia a violação dos direitos humanos  e exige a demarcação da terra indígena.

Confira nota e carta de apoio:

 

 

 

 


Nota Pública em defesa dos direitos do Povo Tupinambá

 

Os docentes do Departamento de Antropologia e Etnologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia vêm a público manifestar sua profunda preocupação com a situação em que se encontram os Tupinambá, povo indígena da Bahia, devido à protelação, desde março de 2012, por parte do Excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça, Dr. José Eduardo Cardoso, de emissão da portaria declaratória ao seu direito definitivo e incontornável aos territórios tradicionais. Declaramos nossa total solidariedade aos Tupinambá e apoiamos, integralmente, a carta ora divulgada pelos antropólogos e pesquisadores que têm desenvolvido pesquisas entre aquele povo (v. carta abaixo), na qual defendem a pronta demarcação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença; protestam contra as reintegrações de posse em curso; e denunciam as graves violações aos direitos humanos que estão sendo praticadas, mais uma vez, contra esse povo indígena.

Salvador, Bahia, 12 de fevereiro de 2014

Abaixo Assinados:

Carlos Caroso. Professor Associado

Carlos Etchevarne. Professor Associado

Cecilia McCallum. Professora Adjunta

Cecilia Sardenberg. Professora Associada

Cíntia Beatriz Müller. Professora Adjunta

Diego Ferreira Marques. Professor Adjunto

Fátima Tavares. Professora Associada

Jocélio Teles dos Santos. Professor Associado

Lívio Sansone. Professor Associado

Luis Nicolau Parés. Professor Associado

Marco Tromboni. Professor Adjunto

Maria Rosário de Carvalho. Professora Associada

Marina Guimarães Vieira. Professora Adjunta

Núbia Rodrigues. Professora Adjunta

Roca Alencar. Professora Adjunta

Urpi Montoya. Professora Adjunta


Carta de apoio à pronta demarcação da Terra Indígena dos Tupinambá, contra as reintegrações de posse e as violações aos direitos humanos dos indígenas

Nós, pesquisadores que desenvolvemos investigações acadêmicas junto ao povo indígena Tupinambá, no sul da Bahia, Brasil, manifestamos publicamente nossa preocupação com uma nova situação que ameaça o frágil equilíbrio na região: nas últimas semanas, a Polícia Federal e a Força Nacional estão cumprindo dezenas de ordens de reintegração de posse em fazendas que incidem sobre o território reconhecido pela União como de ocupação tradicional pelos Tupinambá de Olivença.

É importante ressaltar que, ao contrário do que tem sido divulgado, as mais de 120 “retomadas” efetuadas pelos 13 caciques Tupinambá, ocorreram de forma pacífica e, em muitos casos, em prévio acordo com os fazendeiros. Tais processos de “retomada” têm melhorado, drasticamente, as condições de vida das famílias indígenas sem terra ou expulsas pelo processo histórico de criação das propriedades privadas.

Porém, a demora na demarcação acarretou uma reviravolta preocupante que levou um grupo de fazendeiros, no final do ano passado, a atuar de forma violenta contra os Tupinambá, nos municípios de Buerarema, Ilhéus e Una, queimando casas de indígenas, retendo-lhes e roubando-lhes a produção, hostilizando a quem se solidarizasse com a causa Tupinambá, assim como exibindo outdoors nas estradas com ameaças explícitas aos indígenas, o que determinou a presença da Força Nacional na região.

Como já antevíamos, a lentidão na demarcação da TI dos Tupinambá permitiu o crescimento da campanha anti-indígena que ora divulga a falsa informação de que a demarcação da Terra Indígena dos Tupinambá não será feita, ocasionando, entre fazendeiros e pequenos produtores da região que aceitaram as retomadas na expectativa de indenização, a interposição, de forma massiva, de ações de reintegração das propriedades. Essa situação levou o Tribunal Regional Federal/Ilhéus, a liberar a ordem de reintegração de mais de 70 propriedades “retomadas” pelos indígenas, dentre os mais de 150 pedidos de reintegração à espera de avaliação judicial.

O grande volume de reintegrações é preocupante assim como a recusa em forma geral dos recursos de defesa dos indígenas interpostos pela Procuradoria Regional Federal e pela Procuradoria Federal Especializada para suspender as liminares. Também é preocupante a atuação da Polícia Federal e a Força Nacional ao implementar as reintegrações de posse usando a força de forma desproporcional e, no caso das reintegrações da Serra do Padeiro, fazendo uso ilegítimo de armas de fogo atirando ao ar durante os operativos e de noite como forma de intimidação. Uma situação que levou as famílias que se encontravam nas “retomadas” reintegradas a se refugiarem nas matas das cercanias, situação que gerou, que uma criança de dois anos, a qual se perdeu na confusão gerada pelo operativo policial, fosse detida pelas autoridades e levada ao conselho tutelar.

A situação atual constitui uma clara violação aos direitos humanos e indígenas dos Tupinambá de Olivença não só pela atuação das autoridades federias na implementação dos operativos de reintegração de posse, como também pela omissão das autoridades governamentais dos diversos níveis para salvaguardar a integridade e dignidade dos indígenas, atuando de forma lenta na demarcação da Terra Indígena, omissão que é a causa principal da atual situação de violência contra os indígenas por não indígenas, Polícia Federal e Força Nacional, contexto no qual os Tupinambá se encontram em posição de grande vulnerabilidade.

Em face de tal grave situação, os pesquisadores abaixo assinados requerem da FUNAI e outras autoridades envolvidas que tomem as providências necessárias para suspender os mais de 150 pedidos de reintegração, assim como as liminares que já foram expedidas para reintegrar as áreas retomadas; do mesmo modo solicitamos a Secretaria de Direitos Humanos que investigue as violações contra os indígenas no processo de demarcação da TI dos Tupinambá de Olivença assim como das violações descritas pelos indígenas nas atuais reintegrações de posse. Vale notar que os mesmos pesquisadores já manifestaram, em 2013, a preocupação pela demora na demarcação da TI dos Tupinambá de Olivença – que aguarda, desde o 2 março de 2012, a assinatura do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (Despacho n. 037/PRES 2012) – uma demora sem justificativa já que as contestações foram devidamente analisadas e consideradas desprovidas de elementos capazes de descaracterizar a tradicionalidade da ocupação indígena nos termos do art. 231 da CF/88. Reiteramos que a demarcação é o único meio para garantir a justiça histórica e fazer cessar os conflitos na região.

Abaixo Assinados

Daniela Fernandes Alarcon, mestre em Ciências Sociais (Universidade de Brasília), pesquisadora

associada ao Laboratório de Estudos e Pesquisas em Movimentos Indígenas, Políticas Indigenistas e

Indigenismo da Universidade de Brasília.

Luisa Elvira Belaunde, doutora em Antropologia Social (University of London), professora

visitante no Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Patricia Navarro de Almeida Couto, mestre em Ciências Sociais, com concentração em

Antropologia (Universidade Federal da Bahia), pesquisadora associada ao Programa de Pesquisas

sobre Povos Indígenas do Nordeste Brasileiro da Universidade Federal da Bahia e professora no

Departamento de Ciências Humanas e Filosofia de Universidade Estadual de Feira de Santana.

Erlon Fábio de Jesus Costa, mestre profissional em Desenvolvimento Sustentável junto a Povos e

Terra Indígenas (Universidade de Brasília).

Sonja Mara Mota Ferreira, mestre em Educação e Contemporaneidade (Universidade do Estado

da Bahia).

Susana de Matos Viegas, doutora em Antropologia Social e Cultural (Universidade de Coimbra),

professora no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.

Teresinha Marcis, doutora em História (Universidade Federal da Bahia).

Cecilia McCallum, doutora em Antropologia Social (University of London), professora no

Departamento de Antropologia da Universidade Federal da Bahia e no Instituto de Saúde Coletiva

da Universidade Federal da Bahia.

Amiel Ernenek Mejía Lara, doutorando em Antropologia Social (Universidade Estadual de

Campinas).

Helen Catalina Ubinger, mestre em Antropologia (Universidade Federal da Bahia).