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Em Carta, povos e comunidades tradicionais de MG denunciam a expropriação dos seus territórios

11-07-2022
Fonte: 

Assessoria de Comunicação do CPP | Foto: Letícia Rocha

Em Carta, povos e comunidades tradicionais do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, revelam a situação de precariedade e vulnerabilidade em que as populações tradicionais se encontram no estado. A carta é resultado do Encontro dos Povos e Comunidades Tradicionais do Vale do Jequitinhonha, realizado no mês de junho, em Arara Grande (MG).

O documento denuncia a atuação do Estado em favor dos grandes empreendimentos que colaboram para o processo de expropriação dos territórios tradicionais das comunidades. A carta também exige que os Protocolos Comunitários de Consulta sejam respeitados e ampliados e finaliza exigindo que o Estado tome medidas para recuperação ambiental dos territórios. "EXIGIMOS que o Estado realize ações que promovam: o retorno das águas em nossas veredas, nascentes e córregos; a fiscalização da contaminação dos solos e das águas; a aceleração dos processos de reconhecimento identitários, a emissão de certidões de autoidentificação, bem como dos processos de regularização fundiária das nossas terras tradicionalmente ocupadas".

Confiram a Carta na íntegra logo abaixo ou aqui!

 


CARTA DE ARAÇUAÍ

ENCONTRO DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DO VALE DO JEQUITINHONHA

JUNHO DE 2022

 

Nós, Povos e Comunidades Tradicionais, guardiões da nossa Casa Comum, cientes de que o nosso modo de vida tradicional preserva as dádivas da irmã natureza para as gerações atuais e futuras, reunimos nos dias 09, 10 e 11 de junho de 2022, nas terras da Arara Grande, no Instituto Federal do Norte de Minas Gerais – Campus Araçuaí no “Encontro dos Povos e Comunidades Tradicionais do Vale do Jequitinhonha”.

Somos representantes de 61 comunidades tradicionais do Vale do Jequitinhonha, do Norte e Leste de Minas, da Zona da Mata e representantes de organizações de apoio, perfazendo um total de 108 participantes, cujos objetivos partilhados por ocasião do Encontro foram: apresentação dos resultados da 1ª etapa do Mapeamento de Povos e Comunidades Tradicionais do Alto/Médio Jequitinhonha, análise dos avanços e retrocessos quanto à garantia e efetivação dos direitos, construção e pactuação de estratégias de articulação e fortalecimento.

Os dados do mapeamento apresentados mostraram a situação de precariedade e vulnerabilidade em que nos encontramos quanto ao acesso aos territórios e recursos tradicionalmente utilizados para a nossa reprodução econômica e social, trouxe-nos a certeza de que o contexto adverso em que estamos vivendo é perverso e nos fragiliza com tantas ameaças e opressões; por outro lado, o nosso encontro reacendeu a chama da união, da luta e da resistência. O respeito nos une pelo que somos e representamos em nossas diversidades.

A luta em defesa do nosso modo de vida tem sido incansável e diária. Nossos Territórios Tradicionais estão sendo expropriados. Exigimos respeito aos Protocolos Comunitários de Consulta, que devem dizer como o Estado, as empresas e outros devem ou não atuar em nossos territórios. Estes protocolos foram construídos e conquistados com muita luta e devem ser ampliados para que tenhamos a garantia da autonomia sobre nossos territórios, recursos naturais e saberes tradicionais associados que conformam nossos modos de vida. Denunciamos todas as ameaças que sofremos. Gritamos contra o Estado que viola nossos direitos territoriais, vende e ou facilita o acesso dos nossos territórios aos grandes empreendimentos; incita o medo aos nossos parentes; divide nossas comunidades; implanta projetos de infraestrutura que não dialogam com nossa cultura, nossa tradição; nos priva dos direitos de acesso à água, saneamento, moradia; retira nossos direitos sociais conquistados; nos fornece uma educação formal que não dialoga com a nossa cultura e modo de vida, que não fala nossa língua e que viola nossas identidades.

DENUNCIAMOS E NÃO MAIS TOLERAMOS o agro e hidronegócio, as barragens hidrelétricas, as empresas de monocultura do eucalipto e as mineradoras que: abrem furos de prospecção e deixam as crateras da cobiça em nosso chão, aprisionam e matam os nossos rios, roubam as nossas chapadas e secam todas as nossas fontes de vida; que invadem nossos territórios e pulverizam venenos contaminando a nossa mãe terra e nossas gentes – dizendo que são os donos. Por isso em uma só voz gritamos: fora latifundiários e grileiros, fora SAM, fora SIGMA, fora RIMA, fora NORFLOR, fora Monte Fresno, fora Rio Rancho, fora ArcelorMittal, fora APERAM, fora SUZANO, fora Veracel Celulose e Votorantim Metais, fora TTG Brasil, fora Tomasini, fora Floresta Minas, fora UHE de Formoso, fora Coagro, fora IROBRAS, fora Minas Liga, fora UNIÃO, fora CBL, fora Gerdau, fora Replasa, fora CBA e todas as outras violadoras de direitos; fora ao curso de mineração no IFNMG Campus Araçuaí, fora portaria 148 que proíbe a pesca do Surubim, fora Resolução Conjunta Sedese/Semad nº01/2022, fora Zema e Fora Bolsonaro – governo genocida. Estamos atentos às alianças do Estado com megaempreendimentos que violam nossos direitos fundamentais, que flexibilizam cada vez mais os processos de licenciamento ambiental, vulnerabilizam e criminalizam comunitários e lideranças que se opõem ao avanço desses interesses.

EXIGIMOS que o Estado realize ações que promovam: o retorno das águas em nossas veredas, nascentes e córregos; a fiscalização da contaminação dos solos e das águas; a aceleração dos processos de reconhecimento identitários, a emissão de certidões de autoidentificação, bem como dos processos de regularização fundiária das nossas terras tradicionalmente ocupadas; a revogação imediata da Resolução Conjunta Sedese/Semad nº01/2022, de 04/04/2022 sobre a Consulta Livre Prévia e Informada, porque é inconstitucional e fere frontalmente a nossa autonomia em construir e cumprir nosso projeto de futuro; a criação nas estruturas de governo federal e estadual do/a Ministério/Secretaria dos Povos Indígenas, Quilombolas e Tradicionais; o comprometimento do Estado e aporte de recursos para o Mapeamento de Povos e Comunidades Tradicionais de toda a bacia do Rio Jequitinhonha, dentre outras regiões; o comprometimento das Instituições Federais de educação e da comunidade científica com nossas pautas e políticas de proteção aos nossos povos, nossos territórios e nossa soberania alimentar e nutricional sustentável.

COMPROMETEMO-NOS a manter a articulação dos Povos e Comunidades Tradicionais em toda a bacia do Rio Jequitinhonha, em conjunto com outras bacias hidrográficas do estado de Minas Gerais; a realizar e protagonizar o encontro estadual dos Povos e Comunidades Tradicionais; a seguir firmes e organizados na defesa dos nossos territórios e modos de vida, inclusive na retomada das terras tradicionalmente ocupadas que estão nas mãos de invasores; a escolher/eleger, nas próximas eleições, candidatos/as comprometidos/as com a nossa luta e nossa resistência; a participar das instâncias de controle social, pautando permanentemente o estado; a conservar recursos vitais à preservação da vida, da sociobiodiversidade e da nossa CASA COMUM.

VAMOS À LUTA RUMO À RECONQUISTA E REPOSIÇÃO DOS NOSSOS DIREITOS!

ASSINAM esta Carta (OS PRESENTES NO ENCONTRO):

POVOS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS, COMUNIDADES TRADICIONAIS DE PESCADORES ARTESANAIS, AGROEXTRATIVISTAS, ARTESÃS, GROTEIRAS-CHAPADEIRAS, VAZANTEIRAS, GERAIZEIRAS E ORGANIZAÇÕES DE APOIO.

Linha de ação: 

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