Momento de escuta revela a gravidade das violações sofridas pelos povos e comunidades tradicionais
Por Pe. Dário Bossi, assessor CEPAST - CNBB
De 3 a 5 de setembro, um grupo de bispos e assessores da Comissão Especial de Ecologia Integral e Mineração da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CEEM-CNBB) encontraram-se em reunião presencial e também realizaram uma missão junto ao povo dos quilombos da Baía de Aratu e da Ilha da Maré, em Salvador (BA).
A missão foi preparada pelas pastorais sociais da Bahia, com participação do Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Cáritas. Estavam presentes também lideranças de povos indígenas e quilombolas do interior da Bahia, igualmente atingidas pelos grandes projetos de extrativismo predatório.
Na missão, os bispos e assessores visitaram os quilombos Boca do Rio, Passa Cavalo e Bananeiras, na Bahia, comunidades fortemente afetadas pelos impactos da indústria petroquímica e portuária.
Pela Comissão de Ecologia Integral e Mineração, estavam presentes o presidente e bispo da diocese de Livramento de Nossa Senhora (BA), dom Vicente de Paula Ferreira; o bispo de Sete Lagoas (MG), dom Francisco Cota de Oliveira, o bispo de São Gabriel da Cachoeira (AM), dom Edson Tasquetto Damian e o bispo de Floresta (PE), dom Gabriele Marchesi. Participaram também os assessores da Comissão, padre Dário Bossi, Moema Miranda e Roberto Malvezzi.
“Eles são os produtores da miséria, e descarregam em cima das comunidades pesqueiras e nos chamam de miseráveis”
Processo de escuta
A Comissão fez um processo de escuta das denúncias e dores sofridas das comunidades, que se sentem ameaçadas, violadas em seu estilo de vida e consideradas invasoras e incômodas, apesar de serem habitantes ancestrais destas regiões.
“Eles são os produtores da miséria, e descarregam em cima das comunidades pesqueiras e nos chamam de miseráveis” – exclamou uma liderança local, ao apresentar o drama da comunidade para a comitiva. “Eu me desenvolvi na escola da vida. Não sei falar bonito, porque não me deram oportunidade. Mas tudo o que quero e queremos é liberdade para nossas comunidades” – acrescentou Aloísio, pescador da Ilha da Maré.
O presidente da Comissão, dom Vicente, afirmou que a experiência de conviver com as comunidades afetadas pelos grandes empreendimentos é uma escola de vida. “A gente veio como Comissão e sairemos mais fortalecido pelo vínculo afetivo com o exemplo e a resistência dos atingidos. Eles são irmãos cuidadores da Casa Comum, como nos pede a nossa Igreja”, disse.
Os bispos reafirmaram que há um modelo de desenvolvimento que está passando por cima das vidas, dos corpos das pessoas e da Casa Comum e comprometeram-se a escrever uma carta às autoridades e instituições responsáveis, fazendo ecoar a voz e os direitos das comunidades encontradas.
“Foi uma experiência dolorida, por descobrir o lado escondido da medalha do progresso, do desenvolvimento, que tem um lado podre. O que dói é a arrogância da indiferença, a capacidade de silenciar o sofrimento das pessoas. Não pensava que, depois de tantos anos de cristianismo, ainda a sociedade humana se pudesse basear sobre a arrogância e a força, sem nenhum respeito pelos pequenos” – considerou dom Gabriele Marchesi.
O bispo dom Edson Damian destacou a esperança que vem dos povos quilombolas e indígenas, que se organizam e mobilizam, reivindicando seus direitos. “São estes povos irmanados que vão salvar nosso país e a Ecologia Integral”, arrematou.
“Está sendo um grande aprendizado, pelos desafios que vemos. Não viemos aqui para trazer soluções, estamos aqui na perspectiva do Papa Francisco, que reconhece os protagonistas do território. Esta grande escuta nos faz sentir envolvidos com a causa destas pessoas e nos provoca a unir forças com estas comunidades. Perseverar e esperançar!” – afirmou dom Francisco Cota.
A Comissão planeja ainda convocar um encontro dos atingidos pelos grandes projetos, na Bahia, em 2025, ano da Campanha da Fraternidade sobre Ecologia Integral e do caminho da Igreja rumo à COP30, como momento de escuta e solidariedade com os povos que cuidam dos territórios e representam a principal solução à crise ambiental e climática.