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Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras divulga carta para a COP30

Tipo de publicação: 

Documento reafirma defesa dos povos das águas, denuncia injustiça climática e propõe caminhos para uma transição energética justa e popular durante a COP30 em Belém/PA.

O Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP) divulgou, em Belém, durante as atividades da Cúpula dos Povos na COP30, uma carta política que reafirma o compromisso da entidade com a defesa da Casa Comum, dos territórios pesqueiros e dos povos das águas em todo o Brasil. O documento aponta os impactos da crise climática sobre as comunidades tradicionais, denuncia o racismo ambiental e critica falsas soluções apresentadas pelo mercado, defendendo uma transição energética justa, popular e comunitária. A carta também destaca o papel pastoral e profético do CPP na luta por justiça socioambiental e pela garantia dos direitos dos povos que dependem dos rios, manguezais e estuários para sobreviver.

Leia a carta na íntegra: 


CARTA POLÍTICA DO CONSELHO PASTORAL DOS PESCADORES E PESCADORAS para a COP30

Em Defesa da Casa Comum e da Justiça Socioambiental

 

“Vivemos tempos raríssimos...Tempos de escuta e de resistência.Tempos de fé encarnada e de esperança militante.”(Dom Pedro Casaldáliga)

 

Vivemos tempos raríssimos, como nos recorda Dom Pedro Casaldáliga, tempos em que a fé precisa ter pés descalços, mãos calejadas e coração coletivo. Tempos em que a esperança deve ser tecida nas redes dos povos das águas, que resistem e anunciam outro modo de viver, baseado na solidariedade, na partilha e no cuidado com a Casa Comum.

Nós, mulheres e homens do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP), vindos de todas as regiões do Brasil, reunidos em preparação para a COP 30, reafirmamos nossa missão pastoral e profética junto aos pescadores e pescadoras artesanais, povos e comunidades tradicionais que habitam e cuidam dos territórios das águas. Inspirados pela Teologia da Libertação e pela encíclica ‘Laudato Si’ de Francisco, afirmamos que a defesa da vida e da criação é parte essencial do Evangelho de Jesus Cristo, que nos convida a “cuidar e guardar” a Terra como dom de Deus e herança comum de todos os seres animados e inanimados da criação.

TEMPOS DE CRISE, TEMPOS DE CONVERSÃO

A crise climática é expressão de uma ferida aberta provocada pelo pecado estrutural do capitalismo, que transforma a criação em mercadoria e a vida em negócio. O mesmo sistema que acumula riquezas nas mãos de poucos é o que destrói manguezais e estuários, contamina os rios, devasta as florestas e ameaça a sobrevivência dos povos das águas. Este mesmo sistema assassina e traz violência contra os defensores e defensoras do bem viver e dos direitos de toda a natureza.

Nas comunidades pesqueiras, os sinais da crise são visíveis: o calor crescente nas águas, a mortandade dos peixes, a erosão das margens, as secas prolongadas, a escassez alimentar, o sofrimento das famílias e do planeta. Mas, diante desse cenário, nossos povos não se rendem, resistem, organizam-se e anunciam o Reino de Deus que começa aqui e agora, nos territórios de vida e fé.

A MISSÃO PASTORAL DO CPP: PROFECIA E COMPROMISSO

Como pastoral social da Igreja em saída, o CPP caminha com as comunidades, fortalecendo a organização popular, a espiritualidade libertadora e o protagonismo das pescadoras e pescadores. Nosso compromisso pastoral é triplo: ver, julgar e agir diante da realidade da injustiça climática.

Acompanhamos as comunidades em suas lutas por território, denunciamos as violações de direitos e anunciamos caminhos de justiça socioambiental. Em comunhão com as pastorais sociais, os movimentos populares e as Igrejas da Amazônia, afirmamos que defender a Casa Comum é um ato de fé e que a espiritualidade encarnada dos povos das águas. É fonte de sabedoria para a conversão ecológica que o Papa Francisco nos convoca.

ECOLOGIA INTEGRAL: CUIDAR, DEFENDER E TRANSFORMAR

A ‘Laudato Si’ nos ensina que “tudo está interligado”. Não há cuidado ambiental sem justiça social. Cuidar da Casa Comum é cuidar das pessoas empobrecidas, das mulheres que sustentam a vida, dos jovens que sonham com o futuro e dos anciãos que guardam a memória das marés e dos ventos.

Denunciamos as falsas soluções para a crise climática, o mercado de carbono, a transição energética excludente, os megaprojetos de energia eólica e solar, a mineração e o agronegócio devastador, que violam direitos e expulsam comunidades em nome de uma “economia verde” que continua a servir ao lucro. A verdadeira transição é popular, solidária e comunitária, construída a partir dos saberes e fazeres das comunidades tradicionais.

MOMENTO DE VOZES PROFÉTICAS

A COP 30, que ocorre em Belém do Pará, deve ser um espaço de escuta e de compromisso com os povos das águas. Não aceitaremos ser apenas figurantes de um evento internacional: queremos ser sujeitos políticos, portadores de propostas e experiências concretas de resistência e cuidado.

Levaremos à COP 30 as vozes das comunidades pesqueiras que lutam pela demarcação dos territórios, pela proteção dos manguezais, pelo acesso à água e pela reparação das perdas e danos causados pela injustiça climática. Levaremos também a denúncia do racismo ambiental que afeta desproporcionalmente as comunidades pesqueiras, negras, indígenas, quilombolas e ribeirinhas.

CPP NA CÚPULA DOS POVOS: PRESENÇA PROFÉTICA NA DEFESA DA CASA COMUM

A presença do CPP na Cúpula dos Povos, em Belém, durante a COP30, reafirma a importância de estarmos ao lado das comunidades pesqueiras nos grandes debates sobre justiça climática e direitos territoriais. Aqui, junto aos povos das águas, quilombolas, ribeirinhos e indígenas, afirmamos que não há solução real para a crise climática sem escutar aqueles que menos contribuem para sua causa, mas que mais sofrem seus impactos e o avanço das violências ambientais. Inspirados pela espiritualidade libertadora e pela Laudato Si’, reafirmamos que defender a Casa Comum é defender os povos que a sustentam, seus saberes tradicionais e seus modos de vida ameaçados pelos megaprojetos, pelo mercado de carbono, pela especulação, pela mineração, pelo petróleo e pela chamada “economia verde”.

POR JUSTIÇA CLIMÁTICA E DIREITOS DOS POVOS DAS ÁGUAS

Ao participar das atividades e mobilizações da Cúpula, o CPP declara que a esperança precisa ser militante, como ensinou Pedro Casaldáliga, esperança que caminha, luta e resiste. A COP30 não pode ser apenas um evento diplomático: precisa ouvir os povos tradicionais como sujeitos políticos, portadores de propostas concretas de cuidado e resistência. Em Belém, reafirmamos nosso compromisso com uma transição energética verdadeiramente justa, popular e comunitária; com a denúncia do racismo ambiental; e com a defesa dos territórios pesqueiros, essenciais para o equilíbrio ecológico e para a vida de milhares de famílias. Seguiremos juntos, em rede e em oração, por justiça socioambiental, por dignidade e por um mundo onde nenhuma vida e nenhum território sejam sacrificados em nome do lucro.

ESPERANÇA MILITANTE

O tempo que vivemos exige esperança militante, como dizia Pedro Casaldáliga: esperança que caminha, que reza e que luta. Nossa pastoral é feita da fé em Deus e do compromisso com o povo. Seguiremos navegando juntos, em rede, em comunhão e em resistência, por um mundo onde a vida seja colocada acima do lucro e onde a Casa Comum seja respeitada como sagrada.

Por uma ecologia integral, pela justiça socioambiental e pelos direitos dos povos das águas!
Nenhum território a menos, nenhuma vida a menos!

 

Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras – CPP


Belém, Amazônia, novembro de 2025