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Foz do Amazonas e o petróleo: alerta indígena, pressões exploratórias e histórico de violações ambientais

Declarações do cacique Raoni, divergência entre ministros e dados sobre infrações da Petrobras reacendem o debate sobre a exploração de petróleo na Margem Equatorial. Campanha Mar de Luta reforça: preservar é não perfurar

08-04-2025
Fonte: 

Assessoria de Comunicação da Campanha Mar de Luta

Abril começou com a retomada dos intensos debates sobre a possível exploração de petróleo na Foz do Amazonas e em toda a Margem Equatorial, colocando novamente em evidência as tensões entre desenvolvimento econômico, preservação ambiental e os direitos dos povos tradicionais. A pauta ganhou força com a contundente fala do Cacique Raoni, que alertou Lula para os riscos ambientais e espirituais da perfuração na região, e com a afirmação da ministra Marina Silva de que a decisão “não é política entre ela e o ministro Alexandre Silveira”.

A esse cenário somam-se os dados revelados pelo jornal O Globo, que mostram a Petrobras como a empresa mais autuada pelo Ibama desde 2000 por infrações ambientais — um dado preocupante diante do interesse da estatal na região. Enquanto o governo sinaliza expectativas de avanço no licenciamento, cresce a mobilização de comunidades pesqueiras, lideranças indígenas e organizações da sociedade civil contra o projeto.

“Destruir e destruir e destruir”

O Cacique Raoni Metuktire, uma das mais respeitadas lideranças indígenas do Brasil e do mundo, manifestou pessoalmente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva sua preocupação com os planos de exploração de petróleo na Foz do Amazonas. O alerta foi feito durante um encontro no Parque Nacional do Xingu, que reuniu autoridades do governo federal e diversas lideranças indígenas. Raoni recomendou que Lula reavaliasse a proposta, apontando os riscos ambientais e espirituais envolvidos.

“Estou sabendo que, na Foz do Amazonas, o senhor está pensando no petróleo que tem lá debaixo do mar. Eu penso que não [deveria explorar]. Porque essas coisas, da forma como estão, garantem que a gente tenha um meio ambiente, a terra com menos poluição e menos aquecimento”, disse o indígena. Ele reforçou a importância da preservação ambiental diante da crise climática e concluiu com um apelo espiritual:

“Se isso acontecer, eu sou pajé também. Eu já tive contato com os espíritos, que sabem dos riscos que a gente tem de continuar trabalhando dessa forma, de destruir e destruir e destruir”, completou Raoni.

Lula ouviu, mas não comentou publicamente sobre o tema do petróleo na continuação do evento.

A Campanha Mar de Luta recebe com profundo respeito e admiração a fala do Cacique Raoni Metuktire, que mais uma vez demonstra seu compromisso inabalável com a proteção dos territórios e com o futuro do planeta. Suas palavras expressam a sabedoria ancestral de quem compreende, na vivência e no espírito, os impactos profundos e irreversíveis da destruição ambiental. Quando Raoni afirma que os espíritos não querem a exploração de petróleo, ele denuncia não só uma escolha equivocada de modelo econômico, mas alerta para a desconexão espiritual e ética que empurra o clima ao colapso.

Lógica equivocada de aceitar o risco e tentar remediar depois.

Paralelamente, a Petrobras concluiu a construção de um centro veterinário em Oiapoque, no Amapá, voltado ao atendimento de animais em casos de vazamentos de óleo — uma das principais exigências do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) para viabilizar a licença ambiental de perfuração offshore na sensível região da Foz do Amazonas. Apesar de já contar com licença operacional emitida por órgãos estaduais, a instalação ainda depende da autorização final do Ibama para que possa ser considerada como uma das condicionantes cumpridas para o início das atividades exploratórias.

Para a Mar de Luta, a construção de um consultório veterinário em Oiapoque evidencia a lógica equivocada de aceitar o risco e tentar remediar depois. A verdadeira proteção da vida e dos territórios começa com a recusa à atividade que ameaça causar o dano — e não com estruturas que apenas amenizam suas consequências. Preservar é não perfurar.

Maior número de autuações ambientais

Segundo levantamento da agência Lupa, com base em dados oficiais do Ibama, a Petrobras lidera o ranking de infrações ambientais no Brasil nos últimos 25 anos. De 2000 a 2024, a estatal acumulou 2.757 autuações por danos ambientais, totalizando cerca de R$ 1,5 bilhão em multas. Esses números colocam em xeque a credibilidade do discurso da empresa sobre segurança e responsabilidade socioambiental. Para a Campanha Mar de Luta, trata-se de um histórico alarmante que expõe não apenas o risco de danos futuros, mas um padrão persistente de violações já cometidas — que devem ser consideradas com máxima seriedade diante de qualquer novo licenciamento.

Decisão técnica precisa ouvir as comunidades que serão impactadas

Em entrevista no dia 3 de abril de 2025, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que a decisão sobre a autorização ou não da exploração de petróleo na Foz do Amazonas será técnica e institucional, e não política ou pessoal entre ela e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Marina destacou que o processo está sendo conduzido pelo Ibama com base nos critérios técnicos e legais, e reforçou que sua atuação visa garantir que as decisões sejam tomadas com responsabilidade socioambiental, respeitando os instrumentos de controle e precaução previstos na legislação brasileira.

A fala veio após declarações de Silveira, que manifestou publicamente o desejo de se reunir com Marina para discutir o tema, defendendo que “o Brasil tem o direito de saber se há ou não petróleo na Margem Equatorial”, e alegando que seria possível explorar a área sem causar prejuízos ambientais. A ministra reiterou, no entanto, que não se trata de um embate entre pastas, mas de um processo regulatório que deve seguir as instituições e a ciência.

Para a Campanha Mar de Luta, esse debate escancara a tensão entre os interesses econômicos e os direitos dos povos e territórios tradicionais. Mais do que uma disputa entre ministérios, o que está em jogo é o futuro de milhares de famílias que vivem da pesca artesanal, do extrativismo e de modos de vida que dependem diretamente da saúde dos rios, mares e florestas. A decisão não pode ignorar os alertas da ciência, os impactos já vividos em outras regiões e, principalmente, a voz das comunidades que serão diretamente afetadas. O povo precisa ser ouvido — não apenas como forma, mas como prioridade.

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