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Novo programa de recadastramento preocupa pescadores artesanais

Com oito anos de atraso, governo federal lança programa piloto em Pernambuco. Pescadores Artesanais temem empecilhos para acessar RGP

26-06-2021
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CPP NE 2 | Texto por Verônica Fox |  Foto: Méle Dornelas

Na próxima terça-feira (29), a coordenação nacional de Recadastramento do Registro Geral da Pesca (RGP), da Secretaria de Aquicultura e Pesca (SAP/MAPA), lança o programa piloto de cadastramento e recadastramento de pescadores e pescadoras artesanais, em Pernambuco. De acordo com o agente social do Conselho Pastoral dos Pescadores – Regional Nordeste (CPP-NE), Severino Santos, a ação está prevista para começar a nível nacional em agosto, mas o Estado será o primeiro a realizar o processo em caráter experimental. “Isso se deve a uma ação civil pública que os pescadores artesanais pernambucanos moveram, em relação ao RGP, e que está em acordo judicial entre o MPF, DPU e INSS. Além disso, há um escritório na superintendência com estrutura mínima para auxiliar o grupo social e, ainda, porque Pernambuco é o estado com menor número de registros ativos”, comenta.

Organizações sociais ligadas à pesca artesanal, como o CPP-NE e associações de pescadores, colônias de pesca do litoral e do sertão, Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais de Pernambuco (MPP-PE) e Associação Nacional das Pescadoras Artesanais (ANP), iniciaram processo de discussão com a SAP/MAPA para tentar entender o processo. Embora a demanda seja emergencial, pois desde 2013 o governo federal não emite registros antigos ou novos, prejudicando o acesso do grupo social a direitos trabalhistas e previdenciários, o novo modelo preocupa a categoria que enfrentará uma série de gargalhos. “Por ser online, o processo será ainda mais burocratizado e trará dificuldades tecnológicas para os pescadores acessarem o RGP, pois muitos deles não tem e nem sabem usar internet ou computador. O governo não leva em conta que lida com uma cultura tradicional”, avalia Santos.

PRAZO - Validado pela Portaria SAP/MAPA No. 246/2021, que ainda será publicada, o processo terá normas, critérios e procedimentos administrativos para inscrição no RGP e para concessão da licença de pescador e pescadora artesanal. O grupo social terá um ano para realizar o trâmite. Considerados pela SAP como melhorias, em relação à Instrução Normativa anterior (MPA No. 6/2012), alguns aspectos prometem trazer muita dor de cabeça para os pescadores e entidades de representação. “Percebemos, por exemplo, que o governo não prevê a exclusão de falsos pescadores, para quem será mais fácil praticar fraudes, pois não será mais necessário estar vinculado ou associado a uma organização social para requerer o recadastramento. Isso significa que qualquer pessoa poderá solicitar uma carteira de pescador, mesmo quem tem vínculo empregatício poderá ter um RGP”, alerta o educador social.

O governo também não levou em consideração características básicas do grupo social. No São Francisco, por exemplo, 95% dos pescadores e pescadoras usam embarcações de até 6,5 metros e muitos não têm acesso a Caderneta de Inscrição e Registro – CIR, emitida pela Capitania dos Portos, pois é necessário realizar curso teórico e prático. “Além disso, a Capitania não tem recursos para atender as demandas das comunidades pesqueiras. Para se ter uma ideia, se hoje um pescador solicitar um curso, ele só entrará na grade do ano seguinte. Em anos anteriores, foram menos de quatro cursos realizados para mais de 50 colônias de pescadores no Estado”, comenta o presidente da Colônia Z 05 de Tamandaré, Severino Ramos.

GESTÃO – Há oito anos, quem vive da pesca artesanal enfrenta gargalos recorrentes, para se registrar. “Existem hoje mais de 4 mil pedidos de novos registros parados, em Pernambuco. E, desde 2007, o governo federal não apresenta estatísticas nacionais da pesca artesanal e o ordenamento da atividade acontece de modo pouco técnico, sem dados que permitam uma gestão pesqueira coerente e com ampla participação dos pescadores”, avalia Santos. Essa situação preocupa, pois a pesca artesanal é uma fonte de renda e alimentação importante para várias cidades brasileiras, abastecendo com cerca de 70% do pescado o mercado nacional.

Também não há estatísticas sobre o número exato de pescadores artesanais no país. Segundo informações do antigo Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), havia 1 milhão e 117.912 carteiras de pescadores artesanais, em 2015. “Se até agora foram canceladas 317.398, isso significa que temos mais de 800 mil válidas. Nos últimos anos, esse problema tem se agravado, pois o governo federal, além de não emitir novas carteiras e renovar as antigas, tem cancelado muitas”, explica o educador social. Para os pescadores e pescadoras artesanais o RGP é essencial, pois só conseguem acessar seus direitos, como o seguro-desemprego no período defeso, um ano após receber a carteira.

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